Verdade seja dita: no ranking das cidades mais perigosas do mundo, o Rio de Janeiro figura num fraco 18º lugar, abaixo de várias cidades mexicanas, e outras de que nem vale a pena falar, como Cabul e até outras cidades brasileiras. Mas o índice é feito a partir de números de mortos e feridos. A percepção do perigo não se consegue incluir nas avaliações, e nesse aspeto o Rio é, de facto, um susto constante. Tanto que os cariocas andam sempre com uma pequena quantia no bolso, o chamado “dinheiro do bandido”, para que este não fique aborrecido e parta para a violência. Andar de táxi também não é solução, porque o taxista olha para o taxímetro no final da corrida e diz “não é possível, deve estar avariado” e é melhor acreditar nele.
Há ainda a separação muito nítida do tom de pele; os cariocas, mesmo muito brancos, têm um dourado na cútis que torna fácil distinguir os estrangeiros, mesmo de outro Estado. Um visitante tem de ser particularmente cauteloso.
A polícia estadual tem várias “forças de elite” que, quando disparam, fecham os olhos; quem estiver perto, que tenha cuidado. Além disso há as milícias, grupos de polícias que, quando estão de folga, fazem um dinheirinho extra chantageando os mais pobres ou prestando-lhes serviços ridículos (ligar o gás) por preços estratosféricos.
Todos os edifícios têm seguranças, menos aqueles mais pobres onde os seguranças vivem.
Quanto a polícias propriamente ditos, há os de operações “especiais”, o chamado BOPE (Batalhão de Operações Policiais e Especiais) o COI, o GATE, etc, todos a competir com todos pelo que der lucro. As tão faladas drogas (haxixe e cocaína) fazem parte do mix, evidentemente, com as habituais lutas por zonas exclusivas de distribuição.
A ação que fez manchetes esta semana, particularmente mortífera, não é uma novidade. Regularmente a polícia mata e chantageia traficantes. A novidade é o número de mortos (que na quarta-feira já ia em 112) e a situação política. O Presidente da Câmara do Rio, Eduardo Paes, é inimigo declarado de Lula e tem umas eleições para vencer no mês que vem. Para aumentar a sua popularidade (que já é grande) achou que uma operação com os seus polícias tinha mais efeito do que se chamasse a Polícia Federal. Por outro lado, Lula queixou-se que não foi avisado com antecedência, como se isso pudesse mudar os resultados do massacre.
Mais hipóteses se podem incluir, como a de um entendimento entre as forças policiais do Rio de Janeiro e o Primeiro Comando da Capital, que tem vindo a perder território para o Comando Vermelho.
Também há um desentendimento quanto ao número de vítimas que seriam realmente membros do Comando Vermelho. As forças policiais empurraram as pessoas para um bosque entre duas favelas, para poder atirar à vontade. Eduardo Paes diz que uma pessoa de bem não se ia meter num bosque no meio de uma ação militar – logo, os mortos são todos criminosos.
Este assunto vai morrer rapidamente, porque estamos próximos do COP 30, a cimeira do clima em Novembro, com a presença do Príncipe William da Grã Bretanha, um evento que, como os anteriores, não resolve nada, mas terá grande visibilidade mundial.
E o Rio, visto do alto das coberturas (últimos andares) dos arranha-céus cariocas, estará lindo com certeza!
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