Acompanhe toda a atualidade informativa em 24noticias.sapo.pt

Aos 13 anos Bethany Hamilton foi atacada por um tubarão enquanto surfava no Havai. Perdeu 60 litros de sangue. Foi-lhe amputado a totalidade do braço esquerdo. O trágico acontecimento não a impediu de virar a página das adversidades. Não se resignou, não desistiu e voltou a surfar um mês depois e transformou-se num exemplo global de resiliência e perseverança.

Adaptou-se, foi campeã norte-americana aos 15 anos, abraçou uma carreira profissional de surf, de 2008 a 2023. Esteve em Peniche, na praia de Supertubos, Rip Curl Pro Portugal, etapa do circuito de elite da Liga Mundial de Surf (WSL), em 2010.

Paralelamente, escreveu livros, foi objeto de documentários, como o Bethany Hamilton: Unstoppable, e personagem principal de um filme o Soul Surfer. Acompanhada do marido e dos quatro filhos, a quem ensinam o ABC escolar, viaja pelo mundo a contar a sua história inspiradora. Deus e a fé estão sempre presentes.

Aos 35 anos, oradora motivacional, esteve em Portugal no Norte Surf Fest. Falou com o 24noticiais. Sobre medos, Deus, a família e o seu desígnio.

Bethany Hamilton @Norte Surf Fest
Bethany Hamilton @Norte Surf Fest créditos: Fotografias cedidas por Bethany Hamilton

Aos 13 anos, enquanto estava a surfar no Havai, sofreu um ataque de um tubarão. Perdeu 60 litros de sangue e foi-lhe amputado a totalidade do braço esquerdo. A história é conhecida mundialmente. Tornou-se viral antes dos tempos virais das redes sociais. Como se relaciona com a celebridade?

Para mim, a minha alegria é estar no oceano e estar com a minha família. Tento fazer disso uma prioridade. Todo o ruído e a loucura externa acalma e congratulo-me em ser capaz de encorajar as pessoas através da minha história. Para mim, quando a fama está ligada a um propósito positivo, acarreta algo de bom e alguma beleza. 

“Congratulo-me em ser capaz de encorajar as pessoas através da minha história”

Existe uma Bethany antes e depois do ataque com o tubarão? O que mudou na sua vida?  

Acho que são coisas diferentes. Quero dizer, há alguns aspetos da pequena Bethany de 13 anos, que me fazem dizer “uau, ela era tão resiliente, tão positiva e tão boa”. Gostaria de ter mais disso, mas também sei que muito disso ainda está em mim. Vejo nos desafios da minha vida aquela pequena Bethany, agora em forma adulta.

Ainda tem algo da pequena Bethany?

 Acho que um pouco (sorri), uma versão um pouco diferente, mas há muito dela ainda.

Apesar das adversidades, abraçou o surf profissional durante mais de 10 anos. Nunca olha para o passado e pensa que poderia ser a Sally Fitzgibbons  (quatro vezes campeã mundial ISA e três vezes vice-campeã da Liga Mundial de Surf) ou a Caitlin Simmers (campeã WSL em 2024) e ter atingido o topo no circuito mundial de surf?

Definitivamente, pensei nisso. Mas há muito da vida de Sally que não quero, e muito na minha vida, que é muito rica e bonita. Há dar e há receber. Olho para muitos atletas profissionais e sinto que na vida deles falta-lhes o equilíbrio e muito da beleza que a vida tem para oferecer. Acho que o meu caminho mudou e é diferente, mas foi incrível. Ainda me divirto no oceano e faço o que adoro.

“Olho para muitos atletas profissionais e sinto que na vida deles falta-lhes o equilíbrio e muito da beleza que a vida tem para oferecer. Acho que o meu caminho mudou e é diferente, mas foi incrível. Ainda me divirto no oceano e faço o que adoro”

Pensa no momento que mudou a sua vida de uma forma positiva ou negativa?

Quando puxo a minha a vida atrás, é tão único. A minha vida é muito única. Ultimamente, estamos a viajar pelo mundo e experimentamos diferentes culturas. América, Indonésia, Turquia, Portugal, e vemos todas essas formas diferentes de vida e todas essas pessoas diferentes fazendo a sua vida diária que é muito diferente da minha. E isso faz-me pensar: a minha vida é tão única. E na minha mente, Deus orquestra tudo. Deus é o pintor. Ele pintou. E não poderia ter imaginado isso, mas é lindo e é bom.

Foi profissional de surf, até 2022. É mãe, oradora, tem várias atividades. Como se relaciona com todas essas facetas e como gere o tempo?

Eu e o meu marido, fazemos uma dupla de trabalho, uma equipa. Sem ele, seria muito difícil. Apenas tentamos encontrar um equilíbrio. Priorizamos o que é mais importante para nós. Organizamos a vida à volta disso. A família primeiro, Deus, surf, trabalho e diversão. Tudo o que podemos estar a fazer, juntos, viajamos muito para trabalhar. E trazemos os nossos filhos connosco, em vez de deixá-los em casa.

Os filhos seguem a educação escolar em casa?

Sim. Temos o método de aulas em casa. Escola à distância. O meu marido é doutorado e ensinamos os nossos filhos.

“Surfar tem sido uma dádiva. Mas sem Deus, muito da minha resiliência, não podia ser tão forte. Olho para Deus como a minha força em todos os desafios com que deparo, na maternidade, casamento, vida, trabalho ou negócios. Para mim, Deus é a fundação”

À imagem da educação que recebeu?

Nasci no Havai. Comecei na escola normal, depois a minha mãe ensinou-me em casa desde o sexto ano.. Foi ótimo para mim. Espero fazer isso com os meus filhos. E aqui estamos. Quatro filhos. É o nosso caminho.

Acredita nesse método de ensino?

Sim, acho que é um bênção, uma mãe e um pai ficarem muito envolvidos na vida do filho. E vamos precisar de ajuda, em certas áreas.

Fala sobre Deus em todas as entrevistas e dos planos que Deus tem para a sua vida. Quão profunda é sua fé? Quão profunda é a conexão de Deus com a sua vida? 

Olho para os muitos desafios que enfrento na minha vida. Surfar tem sido uma dádiva. Mas sem Deus, muito da minha resiliência, não podia ser tão forte. Olho para Deus como a minha força em todos os desafios com que me deparo, na maternidade, casamento, vida, trabalho ou negócios. Para mim, Deus é a fundação.

Nunca se zanga com Deus? 

Não, não. Se olharmos para a Fé autenticamente, como Deus diz... nesta vida teremos problemas. Não é correto pensar que a vida será perfeita e fácil, ou tudo estará bem apenas porque temos Fé. Ao contrário, Deus quer que confiemos nele, mesmo nas partes difíceis e nos momentos realmente devastadores.

Analiso os muitos dos desafios mais difíceis da vida, da morte de quem amamos, a perda do braço, relacionamentos, negócios, corrupção, tantos desafios diferentes que enfrentei. E, penso: não sei como as pessoas passam a vida sem Deus. Para mim, foi a minha fundação de esperança e de força. Por isso, não me sinto zangada com Deus. Penso mais no que Ele nos pode fortalecer, mesmo nos momentos mais difíceis.

“Posso ter um pouco de medo, mas não deixo que me derrote. Quero manter-me focada naquilo que acredito, em vez de deixar o medo condicionar o meu caminho”

A América vive tempos difíceis no que toca à liberdade de expressão. Há, como se assiste um pouco por todo o mundo, uma bipolarização de opiniões: "Não estás comigo, estás contra mim". Sente-se confortável em passar a mensagem? Tem medo? 

Oh, meu Deus. Existem momentos em que tenho medo, um pouco escondido. Mas não deixo esse medo condicionar a minha vida, digamos assim. Posso ter um pouco de medo, mas não deixo que me derrote. Quero manter-me focada naquilo que acredito, em vez de deixar o medo condicionar o meu caminho.

Há muito ruído na sociedade, mas se olhar para o quadro maior da vida e do mundo, e as coisas que importam mais, colocar energia nessas coisas, então teremos alegria e paz, mesmo nas dificuldades. E encontrei-as nos últimos cinco anos.

As redes sociais são disruptivas, para o bem ou para o mal. 

Acho que os media e as redes sociais colocam essa nova energia do caos na nossa vida. Conseguir encontrar o equilíbrio com essas ferramentas, que podem ser boas ou más, trazer algo positivo ou negativo, e tentar agarrarmo-nos ao que achamos que é verdade, mas também sair fora quando precisamos de uma pausa. Na verdade, estive fora das redes sociais nos últimos meses. E foi bom.

Mas, no seu caso, usa e tem usado as redes sociais para o lado bom?

Sim, tento usar para algo positivo, encorajador e tentar com isso trazer a esperança. Muitas pessoas podem não concordar comigo, com as minhas posições. Não me importo, é ok, não acho que precisemos de concordar com o outro.

Há pessoas que admiro e não concordo com elas em todos os seus pontos. Nos Estados Unidos, em particular, as pessoas ficam muito irritadas quando alguém não partilha a mesma visão. Podemos admirar o outro por aspetos das suas vidas e não concordar com tudo o que pensam e dizem. 

“Nos Estados Unidos, em particular, as pessoas ficam muito irritadas quando alguém não partilha a mesma visão que têm”

Tem medos? O que a assusta mais? 

Acredito que o medo vem nos momentos mais serpenteantes da vida. As coisas podem estar a ir bem, e, de repente, surge um novo medo. Posso dizer que muito dos meus medos estão ligados à maternidade, em criar meus filhos. Penso: Estou a fazer isto bem? Estou a fazer certo? Estou a mostrar como eles precisam?

Os medos, para mim, surgem principalmente à volta das relações. O casamento é uma coisa muito desafiante. Queremos que resultem, mas as relações são difíceis, temos de trabalhar nesses desafios. As melhores coisas na vida são as mais difíceis. Não somos todos perfeitos, mas a maioria das pessoas poderia concordar comigo. A maternidade é difícil, o casamento é difícil, mas quando nos esforçamos e trabalhamos, são as mais emocionantes e bonitas relações na vida. 

Bethany Hamilton @Norte Surf Fest
Bethany Hamilton @Norte Surf Fest créditos: Fotografias cedidas por Bethany Hamilton

Viaja pelo mundo e fala em público. O que tenta ensinar às pessoas e aos seus filhos?

Adoro ser capaz de partilhar e falar. Na minha adolescência, não gostava de falar, não gostava de estar no radar público e comecei, lentamente, a falar em discursos motivacionais. Parei de pensar em mim e pensei em quem é o meu ouvinte, isso ajudou-me a suster o medo e percebi que podia fazer o bem, ser encorajadora e dar esperança a alguém que talvez possa estar num lugar escuro.  

Assisti a uma entrevista onde diz ser uma mulher muito simples com uma educação simples, que partilha os seus valores e sentimentos.

 Sim! E é interessante, porque penso como a minha mãe e o meu pai me criaram quando era pequena. Fomos muito simples, tínhamos poucos meios, mas compartilhavam as duas maiores paixões, surfar e Deus. E mesmo com pouco dinheiro ainda ajudavam os outros. Lembro-me num Natal, a minha mãe ajudou uma comunidade que não tinha água potável. Gastou 200 dólares. Teve um grande impacto em mim e mostrou-me que podemos ajudar e servir os outros, seja física, mental ou emocionalmente. Podemos servir os outros de variadas formas e maneiras. Sempre quis fazer isso desde pequena. 

Passa a maior parte do seu tempo a falar com e para os outros? O que fala em casa? Quais os conselhos transmite aos quatro filhos? 

Acho que simplifico muito do que falo em público, uma versão simplificada. Do género. Se cairmos, vamos tentar de novo, subimos e vamos de novo.

Bethany Hamilton @Norte Surf Fest
Bethany Hamilton @Norte Surf Fest créditos: Fotografias cedidas por Bethany Hamilton

Os seus filhos surfam? 

 Sim. Estou a ensinar-lhe o meu amor pelo surf e a minha Fé em Deus. Compartilho o que é o mais importante na vida com eles.

Não têm medo de tubarões?

Podem ter o medo humano, normal, de todos os dias, mas não diria que é mais do que uma criança normal. Graças a Deus.

O que imagina em sonhos? Tem alguma imagem que apareça em carrossel nos sonhos?

Não sei, só provavelmente, os filhos lá atrás a divertirem-se juntos. Aloha.

__A sua newsletter de sempre, agora ainda mais útilCom o lançamento da nova marca de informação 24notícias, estamos a mudar a plataforma de newsletters, aproveitando para reforçar a informação que os leitores mais valorizam: a que lhes é útil, ajuda a tomar decisões e a entender o mundo.Assine a nova newsletter do 24notícias aqui.