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Colocar o comboio no centro das cidades foi um dos principais pressupostos do regresso do projecto de alta velocidade entre Porto e Lisboa, em Setembro de 2022. Nessa apresentação, foi anunciado que Vila Nova de Gaia passaria a ter uma estação própria, depois de partir de Campanhã de atravessar o rio Douro através de uma ponte com dois tabuleiros – superior para os comboios e inferior para os automóveis.
A estação seria subterrânea, em Santo Ovídio, no centro da terceira maior cidade do país e com ligação direta à linha amarela e futura linha rubi do Metro do Porto. A localização foi consolidada ao longo dos últimos três anos em diversas apresentações públicas. Também foi incluída no Plano Ferroviário Nacional, aprovado em março de 2025. Consta ainda do contrato da primeira parceria público-privada (PPP), para o troço Porto-Oiã, assinado em julho de 2025, entre a Infraestruturas de Portugal (IP) e a concessionária (consórcio AVAN Norte, liderado pela Mota-Engil).
No entanto, nos últimos meses, o consórcio submeteu a avaliação ambiental a proposta de mudar a localização da futura estação de Gaia para Vilar do Paraíso, junto à A1 e perto da zona industrial de São Caetano. A AVAN Norte defende uma estação à superfície, com quatro linhas, em terreno rural, que favorece os acessos rodoviários. Em vez de uma nova ponte sobre o Douro, haverá duas, uma ferroviária e outra rodoviária Nesta sexta-feira, o auditório da secção Norte da Ordem dos Engenheiros, no Porto, debateu a proposta do concessionário e apresentaram-se os argumentos de cada uma das localizações.
O que mudou?
“No estudo prévio de que a IP dispunha, Santo Ovídio era o único sítio em que conseguíamos fazer uma estação, enterrada, mas com um terreno livre à superfície onde era possível fazer os passageiros chegar à superfície”, enquadrou Carlos Fernandes, vice-presidente da empresa que gere a rede ferroviária nacional. A opção de Vilar do Paraíso surgiu no âmbito do “trabalho de otimização do traçado dentro do corredor aprovado” a nível ambiental e que “está previsto contratualmente”, acrescentou o responsável.
O trabalho de otimização decorreu durante o último ano e meio e envolveu 200 engenheiros, revelou António Campos e Matos, representante do consórcio, durante a apresentação. Desde julho de 2024 que o consórcio liderado pela Mota-Engil sabia que tinha ficado sozinho na contenda pela PPP entre Porto e Oiã, depois de ter sido afastado o consórcio liderado pela espanhola Sacyr. Na altura, a imprensa espanhola noticiou que o valor pedido era demasiado baixo para ser submetida a proposta, atendendo aos custos dos túneis e dos movimentos de terras. No mês anterior, a IP apresentara o plano de pormenor da futura estação de Santo Ovídio.
Ainda durante o concurso público internacional, o consórcio português, no entanto, já manifestara “grande ceticismo” relativamente à localização da estação. Em causa, as “dificuldades inerentes, quer à construção da estação a uma tão grande profundidade e sua complexidade e mesmo quanto ao seu funcionamento”, segundo o relatório de conformidade ambiental (RECAPE) submetido em setembro deste ano. Na sessão de hoje, António Campos e Matos exemplificou a dificuldade de as tuneladoras conseguirem atravessar terrenos de maciço granítico “de elevadíssima dureza”
Para o agrupamento, Santo Ovídio teria uma “estação de tipo apeadeiro, sem vias desviadas, mais se assemelhando a uma estação de metro”. A nível mundial, apenas em Badaling, na China, há uma estação de alta velocidade a tamanha profundidade, alegou o consórcio. Também contribuíram para a mudança da estação “impactes da fase de construção sobre a zona urbana, riscos de segurança da obra, riscos de incumprimento de prazos” e elevados consumos energéticos”. O consórcio apostou numa solução à superfície à boleia da intenção da câmara de Gaia em criar um terminal rodo-ferroviário a sul de Santo Ovídio.
A segurança foi outro dos pontos mais salientados, tendo em conta a retirada de passageiros em caso de risco. Na solução subterrânea, “a diferença muito profunda de situações de confinamento, os difíceis e complexos acessos na estação subterrânea e os fatores de risco internos ou externos, são um importante fator de decisão caso haja ocorrências ou situações que possam gerar pânico”. Além disso, “a complexidade da estação subterrânea é menos intuitiva e dependente de informação menos acessível e de um número muito mais elevado de fatores”.
Nota ainda para a gestão da circulação dos comboios, que ficará a cargo da IP. “Ao termos uma estação com quatro linhas, estamos [a oferecer] uma flexibilidade do ponto de vista de exploração a 50 anos, que é muito superior à estação enterrada e isso obviamente é um valor acrescentado a esta solução”, notou Carlos Fernandes.
Acessos diferentes
Com a estação em Santo Ovídio, os passageiros podem sair do comboio e aceder logo à linha amarela e à futura linha rubi, que já estão consolidadas. A opção é mais favorável para os transportes públicos e reduz o trânsito. Em Laborim de Baixo, as vantagens vão sobretudo para quem usa o carro, estando previsto um parque de estacionamento de mais de 500 lugares. A nova localização está junto à A1 e à futura via de ligação VL3 – com possibilidade de ligação por autocarro rápido. No entanto, mesmo que todos os automóveis sejam elétricos, não fica resolvida a questão do trânsito, gerando problemas no longo prazo.
Para o investigador Álvaro Costa, a nova localização permite a Gaia ligar-se a locais “um pouco dispersos” do sul da Área Metropolitana do Porto, como Espinho e Santa Maria da Feira. “Há pessoas que são cativas do carro e essencialmente quando estão em áreas periféricas não há massa crítica para desenvolver sistemas de transporte público. Isto consolida muito mais o território”, entende o especialista em transportes da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Sobre baixa densidade, Acácio Pires acrescenta a necessidade de apostar em transporte a pedido com veículos elétricos e nas bicicletas, referiu o dirigente da associação Zero
O consórcio propõe que Laborim de Baixo tenha ligação apenas à linha amarela do Metro do Porto, propondo-se a construir o ramal ferroviário a suas expensas. “Não passa pela cabeça de ninguém que uma estação à superfície ou uma estação de alta velocidade não esteja ao serviço por transportes coletivos, nomeadamente o metro”, sinalizou o vice-presidente da IP.
Decisão em 2026
A localização final da futura estação de alta velocidade de Gaia será definida em 2026. O processo está ainda em avaliação pela Agência Portuguesa do Ambiente, que deverá concluir o trabalho ainda neste ano e emitir a declaração de conformidade. Segue-se a análise técnica da IP, a que se poderá suceder uma avaliação jurídica caso seja validada a mudança de Santo Ovídio para Laborim de Baixo, que não consta do contrato de concessão.
Os primeiros 71 quilómetros da linha de alta velocidade entre Porto e Lisboa vão custar perto de 2 mil milhões de euros e deverão ficar prontos em 2032. O contrato de concessão prevê cinco anos de construção de ligação ferroviária, seguindo-se 25 anos de disponibilidade, pelos quais a AVAN Norte irá receber uma renda. Além da nova estação de Gaia, o contrato prevê a ampliação das estações de Campanhã e de Aveiro, nova travessia entre Porto e Gaia e uma ligação à Linha do Norte perto de Canelas, permitindo maior flexibilidade de serviços de passageiros. O projeto conta com financiamento europeu e também será apoiado por empréstimos do Banco Europeu de Investimento.
Na ligação Porto-Lisboa estão previstas mais duas PPP, entre Oiã e Soure e entre Soure e Carregado. Quando todo o projeto ficar pronto, em 2034, será possível viajar entre Porto e Lisboa em menos de 1 hora e 20 minutos.
Para que tudo comece, urge uma decisão, entende Bento Aires. “O importante é que se faça esta ligação Porto-Lisboa. Estamos em tempo de execução e não em tempo de condicionalismos”, apela o presidente da Ordem dos Engenheiros para a região Norte.
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