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Nunca regresses a um sítio onde já foste feliz. Este é um mantra sem grande cientificidade mas cujos exemplos de vida parecem mostrar que nem sempre uma segunda vida no local onde se desenvolveu a primeira será colorida por tons de felicidade.
José Mourinho regressa à casa de partida 25 anos depois. A um lar onde não foi propriamente feliz, ao Sport Lisboa e Benfica. Um retorno que nem sequer estava nas suas cogitações, como assumiu em declarações aos jornalistas no aeródromo de Tires.
Mas o Benfica é o Benfica, o “não” não se coloca e o “sim” é sinal de papel assinado sem pestanejar. O regresso é feito um quarto de século depois de, na altura, em contexto de eleições (estranha coincidência com a atualidade), aí ter iniciado a sua primeira experiência como líder ao comando de uma equipa da primeira divisão.
Foi arma política de João Vale e Azevedo, sem aparentemente apresentar credencias para o ser. Três meses e uma dezena de jogos depois, Vale e Azevedo perdeu as eleições para Manuel Vilarinho. O candidato vencedor tinha assumido o desejo ter Toni no lugar de treinador. E fê-lo.
Há 25 anos, o técnico sadino bateu com a porta, montou um laboratório no União de Leiria, fez a viagem até ao Dragão onde já tinha sido adjunto de Bobby Robson (com quem esteve como tradutor e adjunto no Sporting, Porto e Barcelona). Aí ganhou estatuto e ai começou a começou a construir uma narrativa.
O resto é história. Uma história de títulos nacionais, internacionais, campeonatos, taças, Liga dos campeões, Liga Europa e Liga Conferência.
Mas também uma cronologia de insucessos, despedimentos e mais de 100 milhões de euros de indemnizações como prémio das saídas dos clubes que orientou.
Os sucessos de José Mourinho, 62 anos, são mais uma redoma guardada num museu de História ou Antropologia do que uma exibição itinerante de valiosa arte contemporânea.
O que conquistou ganha pó e há muito que não se vê nada nas mãos de um técnico que ostenta um portfólio de 26 títulos, mas que nos últimos oito anos só ergueu um troféu, a Liga Conferência, ao serviço da Roma.
Mourinho já foi “Special One”. Atualmente, parece ser só mais um. Um treinador que não estará a salvo, nem deixará de ser refém dos resultados e da ténue linha da sina entre a bola que entra e bate nas redes e aquela que embate no poste ou vai ao lado.
Hoje, volta ao futebol português enrolado em politiquices futebolísticas. Mourinho surge como se de uma promessa de “mais habitação” ou “mais saúde” se tratasse.
Desejam os responsáveis encarnados, em especial Rui Costa, que Mourinho lhe garanta mais uns tempos de vida a gerir o Palácio da Luz. Pelo menos até às eleições de 25 de outubro.
Em pleno período eleitoral, Rui Costa sente em perigo o lugar e, mais que nunca, presente que o seu reinado pode findar.
Para se salvar, colou o nome de Mourinho à campanha e a si mesmo. Leva-o às urnas como trunfo pré-eleitoral. Resta saber se apresentação deste cabeça-de-cartaz será suficiente para ser um triunfo.
Reza na história do futebol cá do burgo que poucos toques de midas se consegue dar para o além da receita centenária de sempre.
Rui Costa não inventou. Tal como na época passada, salva a pele esfolando a lã de um carneiro: o treinador.
Em 2024-2025 foi a cabeça de Roger Schmidt a rolar. Quatro jogos apenas na Liga Betclic bastaram para Rui Costa sacudir a pressão nas costas e puxar o tapete ao alemão.
Um ano depois, sem margem de manobra e com inédito e estratosférico investimento na equipa de futebol a pesar-lhe em cima, o antigo maestro no relvado não teve outra alternativa se não carregar no botão mágico para abrir a porta de saída a Bruno Lage, exatamente quatro jogos feitos na primeira liga (Benfica tem um jogo em atraso).
Perante o zurzir da bancada, bastou 90 minutos do desaire europeu para apagar tudo o que Lage tinha feito a pedido da direção. Mundial de Clubes, Supertaça e apuramento para a Liga dos Campeões.
Com reduzida margem para procrastinar, Rui Costa recorreu, sem hesitar, à tradicional carta de rescisão e agradecimentos pelo trabalho desenvolvido do defunto técnico, mesmo que os 100 milhões de euros gastos em contratações tenham tido o aval e dedo do antecessor de Mourinho.
A contratação a um pouco mais de um mês das eleições é uma estratégia de empurrar com a barriga à espera que os resultados no relvado resultem num desfecho eleitoral que permita a Rui Costa voltar a aquecer a cadeira onde esteve nos últimos quatro anos (eleito em outubro de 2021).
José Mourinho chega à Luz embora esperasse sentar-se no banco da equipa das Quinas quando voltasse a pisar território nacional.
Tal como uma figura sebastiânica, apresenta-se ao Terceiro Anel mais com a brisa do passado do que os tons reluzentes do presente.
Será bom na retórica, nas frases para as conferências de imprensa e likes nas redes sociais, e, antecipo, protagonize episódios apaixonados no diálogo com a exigente massa adepta sequiosa de algo que lhes alimente mais a alma do que lhe encha os olhos, embora, toda e qualquer barriga se alimente com a fome de títulos.
É muito provável também que consiga empolgar jogadores mais despertos para o peso da sua sala de troféus do que para o bloco de notas dos treinos e das jogadas pensadas.
Mas, e o resto? As clássicas guerras com alguns elementos dos plantéis, o ego que transporta, o desencanto do seu futebol e as táticas que, dizem, estar presas à suas épocas de sucesso e sem a versão atualizada exigida pelos tempos presentes.
Será o José Mourinho uma Félix renascida ao serviço das águias?
Ou será o mais do mesmo do que se tem visto e tudo terminará em mais uma indemnização ou saída antes do prazo de validade contratual?
A aposta de all-in de Rui Costa, pode também estar a trazer Mourinho para um jogo de casino, com, ou sem, o seu aval.
Costa pode não vencer as eleições e Mourinho voltará a ser escrutinado por um outro presidente que não aquele que o escolheu. Pode sair ou pode ficar.
A dupla Costa-Mourinho podem sair vencedores das eleições, mas não resistirem à presente época. pensará José Mourinho que tal possa levá-lo a perder alguns créditos para a eventual sucessão de Martinez no pós-Mundial 2026.
Ou, “e se tudo correr bem?” (onde é que eu já ouvi esta pergunta), José Mourinho der ganhar um novo elã e nova vida? Triunfar num clube para catapultá-lo para terminar onde assumiu querer fechar a vida profissional?
Terá sido uma boa decisão de ambos? Ou perante o precipício tomaram a decisão que alguns julgam ser certa e deram um passo em frente? A resposta está nas jornadas que se seguem e que colocam a equipa da Luz no caminho de Chelsea e Porto (duas casas onde Mourinho foi feliz). Pessoalmente, e posso estar errado, é muito provável que seja esse o destino.
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