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Durante o concerto da sua digressão Hit Me Hard and Soft em Dublin, no passado dia 26 de julho, Billie Eilish dirigiu-se ao público com palavras calorosas sobre a sua ligação à Irlanda e à plateia que a acolhia. "Como vocês sabem, eu sou irlandesa, por isso é incrível estar aqui. Obviamente não sou daqui, mas é muito bom vir a um sítio onde toda a gente se parece contigo, e são todos tão pálidos como eu. Adoro isso", afirmou a cantora de 23 anos, acrescentando: "Sinto-me tão vista... E estou quase certa de que mil dos meus familiares estão aqui na plateia. Obrigada por terem vindo. Obrigada por me receberem aqui. Adoro este sítio. É tão bonito, e vocês são todos lindos. Vejo tantas caras familiares."

As palavras de Eilish foram recebidas com entusiasmo pelo público no 3Arena, mas online, o entusiasmo transformou-se rapidamente em polémica. Um clipe do momento tornou-se viral nas redes sociais, com críticas que a acusavam de "exaltar a branquitude" e de promover uma ideia de exclusão racial. Comentários como “Billie realmente disse ‘uau, quanta gente branca, gosto disto!’” começaram a circular, enquanto outros questionavam se ela estaria a usar “pálido” como um eufemismo para “branco”. Alguns até duvidaram da legitimidade da sua identificação com a irlandesidade com base no seu aspeto físico.

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No entanto, muitas vozes se apressaram a defender Billie Eilish, argumentando que os comentários foram uma expressão inofensiva de pertença e de emoção pessoal, e que o contexto é fundamental. Jameela Jamil, atriz e ativista, foi uma das figuras públicas a sair em defesa da cantora, dizendo no TikTok que o ataque online era, na verdade, "tédio disfarçado de ativismo". "Acham mesmo que Billie Eilish, que tem tido um percurso exemplar de progressismo desde a infância, de repente se tornou uma supremacista branca a soprar apelos à eugenia num palco na Irlanda?", questionou. E explicou que a artista não faz esse tipo de comentário em todos os países maioritariamente brancos onde atua, tendo sido a sua ligação pessoal à Irlanda, e à semelhança estética com os irlandeses, que inspirou o momento. "Ela estava só entusiasmada por ver pessoas que se pareciam com ela", concluiu.

Também o radialista e humorista português Nuno Markl reagiu, descrevendo o backlash como “um profundo disparate” e um sintoma do “caos em que o mundo está amarfanhado”. Para Markl, o comentário de Eilish foi uma referência irónica à palidez caricaturalmente associada aos irlandeses, como também refere é feito, por exemplo, por Conan O’Brien, e não um sinal de supremacia racial. "Criar este tipo de confusão contra uma voz tão válida como a de Eilish prejudica tudo", escreveu. "Divide onde deveria haver união, porque parte de quem deveria perceber contexto."

Segundo a Newsweek, especialistas em comunicação e cultura concordam que a controvérsia tem menos a ver com intenção e mais com o momento e o contexto em que vivemos. Para a jornalista Marie Nicola, vivemos uma era de “pluralismo interpretativo”, em que cada comentário feito por uma figura pública é automaticamente reinterpretado por múltiplas audiências, em múltiplos contextos culturais e políticos. "Billie Eilish nunca está apenas a falar com uma sala; está a falar com o mundo inteiro, ao mesmo tempo", afirmou. E quando no discurso público a experiência de se sentir “visto” é associada à branquitude, isso pode alienar fãs que não partilham dessa identidade. Nicola sublinha ainda que a ideia de branquitude como “neutralidade”, tão enraizada na cultura pop, está hoje em crise: "No clima atual, qualquer centralização da branquitude já não é lida como neutra. Porque, funcionalmente, já não pode ser."

Também Ana Markl se debruçou sobre o tema como "o momento em que nos começamos a odiar a nós mesmos", concluindo que é "contra as corridas de superioridade moral movidas pela irritação".

Ainda assim, nas mesmas redes sociais que a atacam, muitos insistem que os comentários da cantora foram uma celebração inofensiva das suas raízes e não um ato de exclusão. "Há uma grande diferença entre dizer 'sinto-me vista aqui' e 'este lugar é só para pessoas como eu'", resumiu a especialista em cultura pop Jazmine Henley-Brown.