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Somos pessimistas, não há nada a fazer, e neste período, digamos, do primeiro quarto do século XXI, entre pandemias, crises ambientais, guerras sem fim à vista e uma evidente descida de estatuto da Europa no palco mundial, parece-nos estar a ver uma repetição da decadência do Império Romano – ou de qualquer outro império decaído, que é o que não falta na História.
Contudo, o Eurobarómetro, que é uma sondagem periódica feita pelos burocratas em Bruxelas, dá uma ideia bastante diferente do presente. E não venham dizer que as sondagens são enganadoras, porque os sondados têm tendência a mentir, confundindo a realidade com as suas aspirações. Isso sabem muito bem os sondadores, que tem métodos psicológicos sofisticados para ver através dos enganos e muitos anos de experiência. As amostras, isto é, o número de pessoas que respondem, são de facto muito pequenas em relação ao universo de cerca de 500 milhões de alminhas, mas isso também é levado em conta.
Posto isto, vamos lá ver como nos vemos. Para já, 52% dos europeus confia na UE, o melhor resultado desde 2007. O mesmo número confia na Comissão Europeia, sendo que entre os mais jovens, entre 15 e 24 anos, a confiança é de 59% - maioria absoluta, portanto. Quanto aos governos nacionais, o resultado não é tão bom; 36% para o Executivo e 37% para o Parlamento. Portanto, não acreditamos muito em quem nos governa – santos de casa não fazem milagres – mas esperamos que Bruxelas compense de algum modo as falhas e o fala-barato do nosso país. Hoje em dia já não se discute muito se devíamos ou não devíamos fazer parte da UE, porque o tempo se encarregou de mostrar que é uma almofada contra choques. Claro que há a excepção do Brexit, mas até os ingleses já concordam que foram enganados pela dupla Farrage/Johnson. E também que quiseram ser enganados, porque ainda vivem na ilusão de que são diferentes de todos os outros países. É interessante reparar que a campanha pró-Brexit usou muito do espírito da II Guerra Mundial, “nós vencemos o Continente”.
Mas não quero perder o fio à meada. Um sentimento prevalecente é que 75% acha que são cidadãos da Europa, o que é muito positivo como travão dos movimentos nacionalistas. Aliás esses movimentos já perceberam que não vale a pena bater na tecla dum “exit”. Outra maioria, 62%, mostra-se optimista em relação ao futuro da UE – opinião que eu não participo de todo. Não estou a ver nenhuma indicação de que as coisas possam melhorar, apenas espero que não piorem. Mas isso sou eu, não represento ninguém...
Então, continuando nesta cavalgada para um futuro brilhante (!), 74% dos europeus gosta da moeda comum (simplificou-nos as viagens e as compras pela Internet, sem dúvida). Mas no capítulo da economia, 44% acha-a boa e 48% consideram-na má, o que mostra uma boa percepção de que realmente estamos abaixo dos outros dois blocos, os asiáticos e os americanos.
O que se passa é que a Europa já perdeu a corrida da inovação em todos os campos que importam para o futuro, informática, IA, e mesmo substituição dos combustíveis fósseis pela electricidade.
Poderá recuperar? Não se vêem sinais, sobretudo quando os Estados Unidos agora são governados pelos milionários tecnológicos (Musk, Thiel, Bezos e companhia). O que nos pode valer é que o Rei norte-americano é um ignoramus tecnológico e tem tomado medidas que efectivamente retraiem a investigação científica, como a “guerra” contra as universidades e o fim dos subsídios aos órgãos que se dedicam à pesquisa.
Mais números: nove em cada dez europeus acham que deveria haver uma cooperação regulada entre as potências mundiais – uma opinião que pouco vale, pois, como disse acima, o continente tem cada vez menos influência nas decisões globais. Quanto ao problema das tarifas de importação, uma das piores manias de Trump, 80% acha que devemos revidar ao mesmo nível, posição defendida sem reservas por Bruxelas. Aliás, considerando o volume de negócios entre blocos, o nosso problema é muito mais a China do que os Estados Unidos e o Governo chinês, ao contrário do norte-americano, tem uma política económica mais firme e mais difícil de contrariar.
Quanto à defesa, não há concordância, e isso é muito mau; apenas 43% acha que devíamos investir mais em “segurança” (querendo dizer, em armamento e preparação militar), e apenas 32% é a favor da transição energética.
Também estão em minoria (41%) os europeus que consideram que a paz é o mais importante, que defendem a democracia (33%) e dão valor ao respeito pelas leis e direitos fundamentais.
Contudo, 80% acha que devemos defender a Ucrânia, quer recebendo os ucranianos que estão a fugir da guerra, quer ajudando com fundos e apoio humanitário os que decidiram lá ficar. A maioria também apoia o envio de armamento e as sanções económicas à Rússia. 59% gostaria que a Ucrânia entrasse para a UE.
Considerando todos estes valores, a conclusão é que os europeus por um lado gostam muito da sua União e estão optimistas quanto ao futuro, mas não sabem como defender aquilo que gostam. Por exemplo, são favoráveis à defesa da Ucrânia, mas não têm capacidade para a defender. Estudos que não aparecem nesta sondagem do Eurobarómetro indicam que só daqui a cinco, 10 anos a produção de armamento atingirá níveis substantivos, 2030, é a previsão; e a Ucrânia pode aguentar sozinha mais cinco anos?
Quanto à outra guerra sem fim à vista, Israel contra todos à sua volta, os europeus não gostam muito de falar nisso, estão bastante divididos sobre o lado que favorecem, mas, efectivamente, as simpatias por Israel estão cada vez mais baixas. E não se trata apenas do eterno anti-semitismo, ou de simpatia por muçulmanos,cujos imigrantes atraem antipatias em alguns países europeus, trata-se de repúdio pelos métodos brutais do Governo Netanyahu, mais desprezíveis do que os de Putin, porque está a fazer um verdadeiro genocídio.
Resumindo e concluindo, muito indica que a Europa caminha para a desgraça de cara alegre.
Já é alguma coisa...
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