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Uma crónica não é, no meu entender, um exercício jornalístico. Para mim, o jornalismo faz-se de uma outra maneira. Uma crónica é um espaço de opinião e assume-se essa exposição que, muitas vezes, pode fragilizar.
Ao longo dos anos, escrevi muito sobre a atualidade; escrevi em defesa da igualdade, procurei promover debate e reflexão. Vivemos tempos
difíceis e a minha agenda pessoal não se compraz com a de muitos; talvez por isso, nem sempre fui bem entendida e recebi algum hate mail, como agora se
diz. Nem todos querem saber a opinião de uma mulher que advoga que o feminismo está longe de ser cumprido. Sendo o feminismo uma luta pela
igualdade e não um discurso contra os homens, à semelhança do que alguns insistem em acreditar.
Defendo veementemente que a autonomia corporal não pode estar dependente de terceiros ou do Estado. Não é possível deixar de
gritar que os homens exercem violência sobre as mulheres em Portugal. É o crime com maior incidência e não é praticado por imigrantes.
Sou totalmente contra qualquer conflito bélico e o que se passa em Gaza é uma das maiores atrocidades de sempre. Vivemos hoje a terceira guerra
mundial sem que ninguém a tenha anunciado oficialmente.
Convém estar atento, em vez de fechado numa bolha e, por isso, defendo com todas as forças o ofício do jornalista como essencial, respeitando o código deontológico da profissão. Comovem-me pouco as pessoas com certezas seja do que for. O que me fascina é, e será sempre, a possibilidade do diálogo, de crescer, de ser confrontada com outras possibilidades.
As pessoas que insistem numa ideia sem saber defendê-la tendem a enervar-me. As que não querem saber e não se informam têm o mesmo efeito. Preocupa-me a iliteracia em geral. De momento, a digital parece-me particularmente grave. A verdade é coisa dúbia e manipulável, convém ter ferramentas para distinguir o que é facto e o que é agenda política, económica, corporativa, religiosa.
Muitos encontram no universo digital ligações que colmatam um sentimento de solidão, enganam-se com amizades virtuais, perdem ligações verdadeiras e deixam de conseguir ter relações aprofundadas. Ter impacto na vida dos outros, conhecer e partilhar, permite ir escutando as variáveis do mundo, ao invés de ir no mesmo carril que o algoritmo nos impele a seguir.
As relações humanas parecem precisar de estímulo. São mais difíceis, trazem eventuais dissabores, é certo, mas importam muito. Defendo a gentileza e a interação, as amizades com debate de ideias. Defendo que é na diferença que somos melhores, que encontramos o melhor de nós e dos outros.
São muitas as pessoas que preferem alguém que não questione, que não tenha memória, nem referências. Alguém sem sentido da História. Todas as alarvidades e violências que recebi, em especial por escrito, foram um teste e passei, com o tempo, a entendê-las com a bonomia que só se alcança com a idade. Encolher os ombros e seguir em frente. Certas pessoas e certas coisas só têm a importância que lhes damos e é evidente que, através da agressão, não há qualquer respeito ou espaço para a promoção de pensamento.
Para compensar, recebi centenas de mensagens de leitores que procuravam explorar as temáticas abordadas, que se identificavam com a minha posição
ou, pelo contrário, estavam num outro lugar, mas disponíveis para o diálogo. A esses, agradeço.
Citando o que um dia me escreveu essa gigante escritora que radiografava a sociedade com humor e inteligência, Agustina Bessa-Luís, deixo-lhes um aceno de cabeça, como quem passa por eles na rua.
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