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A NECESSIDADE DE CONTROLO
A importância da sensação de controlo
Quantas vezes já te deram este conselho: «Não tentes controlar tudo»? Quantas vezes percebeste que não podias controlar tudo, mas, mesmo assim, tentaste? Alguma vez te disseram «Deixa fluir», ou «Vamos deixar fluir», e tu pensaste: «Está bem, mas fluir para onde?»
E se eu te dissesse que ter uma certa sensação de controlo sobre a nossa vida e sobre o que nos acontece é importante? Na verdade, as pessoas precisam de sentir que têm controlo.
Não acontece só contigo; é um facto que, sem essa perceção de controlo, teríamos a sensação de viver no caos, na incerteza e ao sabor do acaso, o que equivaleria a sentirmo‑nos rodeados de ameaças e perigos por todo o lado. Quem é que se sente confortável assim? Em maior ou menor grau, todos precisamos de controlo. Não, o teu amigo hippie que não se importa com o sítio onde dorme, onde come ou com o que faz da sua vida não vive no caos. O teu amigo hippie também precisa de uma sensação
de controlo, ainda que seja da forma mais básica. Todos precisamos de nos sentir seguros e protegidos, só que cada um à sua maneira.
A sensação de controlo é importante porque:
- Reduz a ansiedade. Quando sentimos que aquilo que a vida nos oferece é controlável, reduzimos a incerteza e, com ela, a ansiedade.
- Permite‑nos agir. Quando sentimos que há alguma coisa que controlamos, passamos à ação. Agir sobre algo que vemos como uma ameaça de certa forma tranquiliza‑nos.
- Dá‑nos segurança em relação a nós próprios e ao que nos rodeia. Um ambiente controlado é um ambiente seguro.
Alimenta a nossa autonomia e autoconfiança. A sensação de controlo ajuda‑nos a acreditar que somos capazes de lidar com a vida.
O que acontece quando não temos essa sensação de controlo?
- Medo, stress e ansiedade. Surge a inquietação, a incerteza, a sensação de que pode acontecer qualquer coisa a qualquer momento. Sem sensação de controlo, a nossa amígdala ativa‑se.
- Resignação aprendida. Este conceito é muito interessante. Dizemos que alguém vive num estado de resignação aprendida quando aprende a agir de forma passiva ou resignada perante os problemas porque, em algum momento da sua vida, assumiu a crença de que não tem controlo sobre o resultado das coisas e que, por isso, nada do que fizer importa.
As crenças associadas que podem acompanhar esta aprendizagem são: «Faça o que fizer, não vou conseguir nada» ou «Não sou capaz».
A resignação aprendida observa‑se frequentemente em pessoas com depressão, mas também em pessoas sem qualquer psicopatologia. Estes indivíduos acreditam que não conseguem fazer uma determinada coisa quando, na realidade, conseguem, pois têm as capacidades e as competências necessárias para o fazer.
Os animais também podem comportar‑se com resignação aprendida. Vou contar‑vos a história do elefante acorrentado, um conto popular retomado por Jorge Bucay em Deixa‑me Que Te Conte.
O elefante acorrentado
Era uma vez um elefante bebé que vivia num circo. O pequeno elefante não gostava do circo porque era mal tratado e, por isso, de vez em quando, tentava fugir.
As pessoas que trabalhavam no circo perceberam e decidiram impedi‑lo; ataram‑lhe uma corda à perna e prenderam‑na a um enorme prego que fixaram no chão. O elefante bebé puxava a corda para tentar parti‑la e fugir, mas sem êxito. Assim, aprendeu que puxar a corda e tentar fugir não servia de nada e acabou por desistir. Cresceu e continuava amarrado com a mesma corda que o prendia desde pequeno. Na verdade, embora com o seu tamanho de adulto pudesse arrancá‑la com um simples puxão, não o fazia… Há muito que aprendera que puxar a corda era inútil, e agora, que poderia libertar‑se com um simples gesto e sem esforço, nem sequer ten‑ tava. Aquele elefante nunca fugiu porque, apesar de ter capacidade para o fazer, agia a partir da resignação
aprendida.
A sensação de controlo é importante, mas (há sempre um mas) ter uma sensação de controlo não é o mesmo que controlar tudo (ou ter o controlo absoluto). Há uma ligeira diferença que radica na perceção que se tem do que significa controlar. Não é o mesmo confiar que amanhã o sol voltará a nascer ou fazer com que, com esforço e vontade, o sol volte a nascer amanhã. Há coisas que não dependem de nós e que não podemos controlar. O controlo absoluto não existe.
Mas se é verdade que, racionalmente, compreendemos que não podemos controlar tudo, o nosso instinto é fazê‑lo, ativando algumas funções que já conhecemos, como a preocupação ou a ruminação. Através delas, o cérebro tenta recuperar essa sensação de controlo, mas é claro que dois mecanismos que são ativados em situações que não conseguimos controlar são dois elementos que, como já vimos, retroalimentam ainda mais o desconforto.
Vê bem a confusão em que estamos.
Não conseguimos controlar tudo, sabemos isso, mas, mesmo assim, tentamos fazê‑lo. Pior ainda, tentamos fazê‑lo com me‑ canismos que são contraproducentes. O que nos resta, então?
Talvez a solução passe por encontrar um meio‑termo.
Talvez a solução seja recuperar a sensação de controlo sem precisarmos de controlar tudo.
Não podemos controlar tudo, mas não poder controlar tudo não significa que não possamos controlar alguma coisa.
E se acontecer o pior? Sensação de controlo versus controlo absoluto
Vou contar‑te uma experiência de vida muito dura que me fez compreender a diferença entre alguma sensação de controlo e o controlo absoluto.
Em agosto de 2023, a minha avó adoeceu gravemente. A mãe da minha mãe era como uma mãe para mim. Éramos muito chegadas, vivemos juntas durante um tempo e isso criou uma relação forte entre nós.
Um dia, sem que nada o fizesse prever, teve de ser internada de urgência. Durante vários dias, fizeram‑lhe exames. Foram momentos de incerteza muito duros. Alguém que amas muito está mal, a sofrer, e tu não sabes o que se passa. Quando os médicos finalmente descobriram, deixaram claro que o prognóstico não era bom: cancro com metástases em todos os órgãos. A julgar pela velocidade de reprodução, era muito agressivo. Nunca chegámos a saber que tipo de cancro era, pois fazer uma biopsia no estado em que ela se encontrava, sabendo que nenhum tratamento resultaria, podia fazê‑la sofrer ainda mais. Em poucos dias, a minha avó deixou de andar pelo seu pé e passou a estar sob a vigilância atenta dos profissionais de cuidados paliativos. Ninguém esperava aquilo. Não é um assunto sobre o qual quiséssemos voluntariamente pensar. Mesmo que em algum momento da minha vida o tivesse sequer imaginado, nunca poderia saber como reagiria ou o que faria num caso assim.
Passei por muitas fases: choque, negação, raiva, tristeza… Perguntei várias vezes aos médicos se havia alguma coisa que pudesse ser feita para a ajudar a recuperar, mas as respostas foram sempre demolidoras.
Perante situações em que não podes fazer nada, a sensação de controlo abandona‑nos por completo. De repente, a tua vida
torna‑se um caos absoluto. Não consegues comer, não consegues dormir, mal consegues respirar normalmente. Sentes que a ameaça te persegue, mas não sabes como lidar com ela.
Comecei a ficar obcecada em encontrar uma saída. A cura. A solução. Pesquisei na Internet e contactei outros médicos, mas todas as opiniões coincidiam: não havia cura. Nenhuma opção alimentava a minha esperança.
Rendi‑me. Aceitei o inevitável. O fim estava próximo. Não podia continuar a correr de um lado para o outro como uma galinha sem cabeça, tinha de me concentrar ou acabaria por me perder. Se queria realmente ser útil, tinha de mudar de estratégia. Depois de muito refletir, cheguei a uma conclusão clara:
«Não posso controlar toda a situação, mas posso controlar uma pequena parte.» Não posso assumir a responsabilidade por uma doença incontrolável e por um processo médico que me ultrapassa. Não sou médica, mas sou neta da minha avó; posso assumir a responsabilidade pelo que eu, María, posso fazer neste momento. Por isso, ganhei coragem e tentei mudar. Assumi a situação como pude e consegui controlar aquilo que estava ao meu alcance, como ajudar a minha família a tornar os últimos dias da minha avó o mais agradáveis possível. Participei em todas as tarefas o mais que pude, fiquei no hospital o tempo que foi necessário e, sempre que pude, estive presente. Assumi, por decisão própria, um papel ativo. A perda foi muito dolorosa, mas fiz tudo o que podia com os recursos que tinha.
Ter alguma sensação de controlo em situações difíceis significa fazer tudo o que está ao teu alcance com os recursos que tens.
Com a minha experiência, aprendi que, quando as coisas correm mesmo mal e sentimos que perdemos o controlo, precisamos de:
- Não tentar controlar tudo. Não é possível ter o controlo absoluto.
- Concentrarmo‑nos naquilo que podemos controlar, sejam as nossas ações ou as nossas decisões.
- Agir com aquilo que faz sentido, que é viável e alcançável.
- Acreditar firmemente que estamos a fazer tudo o que podemos com os recursos que temos. Mesmo no pior dos cenários, podemos sempre ganhar alguma coisa, nem que seja apenas uma aprendizagem.
A chave está em fazer tudo o que for possível dentro do que é possível.
Se és exigente ou tens um forte sentido de responsabilidade (como eu), sei que, faças o que fizeres, vais querer fazer sempre mais, mas essa é uma batalha com a qual também terás de lidar.
Um exercício que considero interessante quando nos senti‑ mos ansiosos perante a falta de controlo, a sensação de que algo nos supera, é visualizar qual é a fantasia catastrófica que nos está a bloquear. Dar nome e forma ao medo pode ajudar‑nos a perceber que aquilo que imaginamos está fora do nosso controlo e que é precisamente por isso que sentimos tanta angústia. Não podes controlar as consequências do que imaginas, mas podes controlar o que imaginas.
Aceitar que não podes controlar tudo leva‑te a aceitar que nem tudo depende de ti, e aceitar que nem tudo depende de ti permite‑te aceitar que tens de baixar o grau de exigência e responsabilidade. E, mesmo que objetivamente algo dependa de ti, existe sempre a possibilidade de isso poder correr mal. Podemos equivocarmo‑nos e podemos falhar. Não somos infalíveis, somos humanos.
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