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Cinquenta anos depois de lançar "A Voz do Samba" e de eternizar “Não Deixe o Samba Morrer”, Alcione continua a ocupar um lugar raro na música brasileira — o da mulher que moldou a história do género musical.
Para celebrar mais de meio século de carreira, a artista atravessa o Atlântico e apresenta uma nova digressão em Portugal, com concertos no Casino Estoril, a 20 de novembro, no Coliseu dos Recreios, a 21 de novembro, e no Coliseu do Porto, a dia 24.
Aos 77 anos, Alcione mantém a voz poderosa e o carisma que a tornaram um ícone incontornável — uma figura que ajudou a renovar o samba, aproximá-lo de novas gerações e levá-lo a plateias de todo o mundo. Os espetáculos prometem revisitar momentos marcantes da sua trajetória, num encontro que mistura emoção, memória e a energia única que sempre a acompanhou em palco.
À conversa com o 24notícias, a artista recorda a infância no Maranhão, a mudança decisiva para o Rio de Janeiro, os desafios que enfrentou, a espiritualidade que a guiou e o legado que quer deixar às próximas gerações.
Como foi crescer no Maranhão?
Crescer no Maranhão no meio de uma família tipicamente nordestina, com muitos irmãos e irmãs, naqueles tempos mais lúdicos onde as brincadeiras infantis e de rua eram uma rotina... Ah, isso só poderia me trazer boas lembranças!
O que mais marcou esta infância?
A nossa família não tinha posses, mas nunca faltou amor entre nós. E fomos educados para termos autoestima, independência e jamais baixarmos a cabeça para ninguém.
E como foi a mudança para o Rio de Janeiro, com apenas 20 anos?
Fui para o Rio de Janeiro como o firme propósito de realizar o sonho que já acalentava, há tempos: o de ser cantora. Viver desse ofício sempre foi um objetivo, uma meta de vida, e saí de São Luís por conta disso.
Fora do eixo Rio-SP, naquela época, era inviável para um artista tornar-se conhecido nacionalmente. Eu era muito jovem, mas já sabia o que queria da vida.
Há 50 anos, a Alcione lançava o seu primeiro disco, “A Voz do Samba”. O que diria a si própria, se pudesse voltar atrás no tempo?
Não desista, vai dar certo!
Claro que com o aprendizado desses mais de 50 anos de estrada poderia evitar alguns percalços e transitar mais confortavelmente para atingir os meus objetivos. Mas também acho que as dificuldades nos fazem evoluir e, ao mesmo tempo, descobrir forças para o enfrentamento de todo e qualquer problema que possamos encontrar pelo caminho.
Tem 30 álbuns de estúdio, nove ao vivo e oito milhões de cópias vendidas em todo o mundo. É uma mulher realizada?
Sou uma mulher muito feliz e uma profissional que sabe que fez as escolhas certas.
A meta era viver do ofício, do canto, e uma trajetória dessas, de tamanho vulto, nem sequer passava em nenhum dos meus melhores sonhos. Quando a gente faz o que gosta e, ainda por cima, tem êxito nos nossos projetos, a satisfação é imensurável. Mas é importante dizer que continuo sonhando e tendo planos, e jamais deixarei de tê-los.
Qual considera a música mais marcante da sua carreira?
"Não deixe o samba morrer", que desde o lançamento transformou-se num hit! O sucesso foi tamanho que a música ficou, inicialmente, durante 22 semanas no topo das paradas musicais. Além disso, para minha alegria, essa canção virou praticamente um hino para os sambistas. Não há roda de samba, pagode ou qualquer encontro musical aonde não se faça presente. E, claro, é uma das músicas que não posso tirar do roteiro dos shows por ser uma das favoritas do público.
A uma certa altura da sua vida, passou por um milagre. Diz que graças à espiritualidade, conseguiu nunca parar de cantar. Qual é a importância da religião na sua vida, e na sua música?
Foram momentos difíceis e, inclusive, me disseram que poderia ter problemas para continuar a cantar. Depois disso, graças a Deus, após uma cirurgia realizada pelo Dr. Fritz, na Espiritualidade, não só voltei a cantar como ganhei muitos discos de ouro e platina!
Creio em Deus e nos Orixás, e respeito todas as religiões. Não importam designações, mas seguir as doutrinas que as regem. Fazer o bem e amar ao próximo deveriam ser as máximas, as diretrizes sempre, e para todos os discípulos de quaisquer manifestações religiosas.
Qual é o segredo para não deixar o samba morrer?
O poeta já deu a dica faz tempo: "samba, agoniza mas não morre, alguém sempre te socorre" ... e é isso mesmo. O samba é fruto de nossa identidade e um dos nossos melhores e mais conhecidos cartões de visita. Ele pode nascer no morro, na cidade, em becos, vielas, mas também em coberturas e mansões. Não carrega preconceitos de qualquer espécie apesar de ter sido tão discriminado desde o nascimento. É genuíno, está tão entranhado em nossas almas e corações que sempre terá mesmo alguém para "socorrê-lo antes do suspiro derradeiro", conforme escreveu o nosso grande e saudoso Nelson Sargento.
Como é cantar em Portugal?
É sempre uma alegria, uma satisfação imensa porque, além de rever tantos fãs brasileiros que moram em Portugal, também tenho a felicidade de contar com o carinho dos portugueses. É um povo irmão, acolhedor, que sempre me recebeu de forma afetuosa, calorosa. Além disso, o próprio idioma facilita a nossa comunicação e facilita a interação com as plateias.
Que legado musical quer deixar para as próximas gerações?
O cantor é um "porta-voz de sentimentos". É também um profissional responsável pela divulgação e propagação das obras de autores e compositores que, nem sempre, conseguem chegar ao grande público. E foi isso que sempre quis ser: apenas mensageira, uma porta-voz de emoções e de sentimentos que pudessem tocar o coração das pessoas.
Acho que esse pode ser um legado natural, mas é uma premissa inerente aos cantores... E as novas gerações sabem disso, tanto que já estão dando os seus "recados" por aí de forma contundente e admirável. O samba e a música brasileira vão continuar sendo bem representados, e eu espero ter contribuído um pouquinho pra isso.
*O 24notícias manteve as respostas originais de Alcione em português do Brasil*
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