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"Já é possível registar os edifícios devolutos da cidade de Lisboa, em breve Porto e Portugal inteiro. A ideia é conseguir identificar todos os edifícios devolutos e acabar com a retórica de que não existem casas suficientes para habitar". Foi assim que a nova aplicação Devolutos, criada em junho passado, se apresentou ao mundo e em poucas semanas mapeou mais de 1000 casas na capital portuguesa.
A notícia fez correr muita tinta, não só em jornais, pois também se tornou viral nas redes sociais. Quem não gostou desta iniciativa criada por designers foram os proprietários, nomeadamente a Associação Nacional de Proprietários (ANP) que considera esta iniciativa "ilegal", ameaçando mesmo "avançar para tribunal".
"Esta aplicação pretende ser um verdadeiro Big Brother com intuitos persecutórios em relação aos proprietários privados, em nada contribuindo para a resolução do problema de acesso à habitação pelas camadas desfavorecidas da população"Sílvia Sousa, diretora da ANP
"Esta exposição de locais é indevidamente apelidada de 'devolutos'. A palavra 'devoluto' significa vago, livre, desocupado, não habitado, vazio; mas pronto a ser habitado. Ora, não é isto que as imagens retratam. Antes apresentam ruínas, fachadas sem miolo ou locais degradados em que nem os ratos se metem lá dentro, quanto mais os humanos", começa por dizer ao 24notícias Sílvia Sousa, diretora da ANP, acusando a nova aplicação de funcionar com um "big brother".
"Esta aplicação pretende ser um verdadeiro Big Brother com intuitos persecutórios em relação aos proprietários privados, em nada contribuindo para a resolução do problema de acesso à habitação pelas camadas desfavorecidas da população", salienta.
Quanto ao estado atual deste tipo de edifícios, cujos proprietários da aplicação dizem servir para novas habitações, a ANP salienta que tais condições ficaram a dever-se ao "congelamento de rendas".
"O estado de degradação a que chegaram muitos edifícios, deve-se ao congelamento de rendas, primeiro em Lisboa e no Porto, alargado a todo o país em 1974, que, ao manter até hoje contratos vinculísticos, para toda a vida, em que cerca de 200.000 contratos de arrendamento, 20% do total, pagam rendas mensais inferiores a 100 euros. Qualquer pessoa percebe que esse muito pequeno rendimento não permite sequer mandar um trolha ao telhado mudar uma telha, quanto mais proceder a obras de manutenção e conservação", referiu Sílvia Sousa.
App vai "continuar a partilhar imagens"

Imune a ameaças estão os proprietários da aplicação, que comparam a Devolutos com, por exemplo, o Google Maps. "Se a ANP quer realmente fazer dinheiro com ações judiciais, sugerimos que processem a Google primeiro. Têm mais recursos e muito mais fotos. Se os imóveis estão devolutos há décadas, talvez mereçam uma visita. Se estão à espera de obras, façam-nas. Se o proprietário não tem dinheiro para as obras, que liquide o imóvel. Se são para arrendamento, disponibilizem-nos. Se são para hotéis, assumam-no. Não identificamos proprietários, não invadimos privacidade, só mostramos o que está à vista de todos. Fotografar os imóveis? As casas não têm sentimentos. Não sentem vergonha. Mas talvez devessem", dizem.
"Não podemos continuar a tratar a habitação como uma mercadoria especulativa. O direito à habitação só será concretizado com o fim do absurdo que é haver tantas casas sem gente, e tanta gente sem casa", referem, apontando o dedo às câmaras municipais.
“Não identificamos proprietários, não invadimos privacidade, só mostramos o que está à vista de todos”, garante o coletivo"
"As câmaras conhecem muitos destes imóveis, mas demoram a agir. Com a Devolutos, queremos mostrar que os cidadãos não estão dispostos a esperar mais. Não é admissível que o património urbano esteja ao abandono enquanto milhares de pessoas vivem em situação de emergência habitacional" dizem os criadores, que prometem continuar a "lutar" pela habitação.
"A Devolutos vai continuar a mapear. Vamos continuar a partilhar imagens. Vamos continuar a mostrar que o problema não é a exposição. É o abandono", concluem.
Refira-se que a aplicação promete, na sua apresentação, "dar aos cidadãos uma ferramenta concreta para identificar, mapear e pressionar a recuperação dos imóveis abandonados", estando disponível gratuitamente para dispositivos Android e iOS, mas também em versão web "para que toda a gente possa denunciar o abandono do património urbano".
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