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As regras agora divulgadas surgem num contexto de grande tensão, como os protestos pela Palestina a intensificarem. Em Cambridge, os conflitos em torno de académicos com opiniões polémicas sobre o conflito, como a professora Kathleen Stock, conhecida por defender posições críticas em relação à identidade de género, têm provocado algum ruído.

Segundo o The Guardian, os estabelecimentos de ensino só poderão penalizar estudantes ou docentes em casos de discurso ilegal ou assédio. Ficam assim limitadas medidas disciplinares contra quem expressa opiniões que, ainda que controversas, se mantenham dentro dos limites da lei.

Ainda assim, alguns especialistas consideram que as novas diretrizes não resolvem plenamente o dilema entre proteger a liberdade de expressão e garantir que certos discursos não tenham efeitos negativos sobre o ambiente académico. Há receios de que falte clareza na forma como as universidades devem agir perante situações mais ambíguas.

As orientações desaconselham, por exemplo, a proibição prolongada de acampamentos de protesto relacionados com Gaza, uma medida tomada em Cambridge, mas alertam para a necessidade de travar manifestações que se tornem demasiado agressivas ou intimidatórias, sobretudo se perturbarem estudantes judeus.

Outros pontos relevantes incluem:

  • Os docentes não devem ser pressionados a alinhar com posições específicas.
  • Protestos com base em opiniões legais não devem ser restringidos.
  • Não se deve incentivar alunos ou funcionários a denunciar colegas por expressarem opiniões legítimas.
  • As universidades são obrigadas a garantir liberdade de expressão para oradores convidados.
  • As novas regras ajudam a interpretar a futura Lei do Ensino Superior sobre Liberdade de Expressão, que entrará em vigor em agosto.

Julian Sladdin, advogado especialista em regulação do ensino superior, reconhece que as orientações trazem alguma clareza, mas alerta que muitos desafios permanecem. “As universidades continuam a lidar com questões complexas e polarizadoras no dia a dia. A fronteira entre o que é ou não discurso permitido está constantemente a ser testada, e as orientações não respondem a todas essas nuances”, afirmou, em entrevista ao The Guardian.

Entre outras implicações, as instituições deverão tolerar que estudantes e docentes usem as redes sociais em nome pessoal, mesmo que isso tenha impacto na reputação da universidade, mas poderão intervir se a atividade interferir com funções profissionais, como o ensino.

Recorde-se que o OfS (Office for Students) multou recentemente a Universidade de Sussex em 585 mil libras, alegando falhas na proteção da liberdade de expressão da professora Kathleen Stock, que se tornou alvo de protestos devido às suas opiniões sobre identidade de género e direitos trans.

Um inquérito conduzido pelo regulador revelou que 21% dos docentes não se sentem livres para abordar temas sensíveis nas suas aulas. Entre eles, 19% identificam-se com a esquerda política, e 32% com a direita.

Bobby Duffy, do Policy Institute no King’s College London, reconhece que a aplicação destas regras será sempre complexa: “É impossível ter leis totalmente claras nesta área. Este é um espaço que já está profundamente marcado pelas divisões culturais e sociais, e o próprio uso dos mecanismos legais pode ser uma forma de fazer política.”

Arif Ahmed, diretor da OfS para a liberdade de expressão, sublinhou que as universidades continuam a ter margem para agir. “Ninguém está a dizer que se deve permitir gritos durante exames ou que um professor de matemática dedique as aulas aos seus pontos de vista políticos. Mas devem ser tomadas medidas firmes contra discursos de ódio ou assédio. O antissemitismo, por exemplo, não pode ser tolerado”, defendeu.

As orientações sugerem ainda que as universidades possam recusar a matrícula de estudantes estrangeiros cujo financiamento dependa do cumprimento de políticas impostas por governos estrangeiros, o que pode afetar alunos oriundos de certos países asiáticos ou do Médio Oriente.

A Universities UK, organização que representa os interesses das instituições de ensino superior, reagiu em comunicado: “Concordamos plenamente que a liberdade de expressão deve ser protegida e promovida. Estas orientações abordam questões delicadas, e é positivo que o OfS tenha acolhido parte do feedback anterior. Continuaremos a colaborar com o regulador e com o governo para garantir que as universidades recebam o apoio necessário nesta nova fase.”

O que é a OfS?

A Office for Students é o organismo regulador do ensino superior em Inglaterra, responsável por garantir que as universidades funcionam no interesse dos estudantes. Criada em 2018, a OfS supervisiona aspetos como a qualidade do ensino, a liberdade académica, o acesso equitativo à educação superior e a sustentabilidade financeira das instituições.

Além de regular as universidades, a OfS tem também poderes sancionatórios, como ficou evidente na multa aplicada à Universidade de Sussex pela forma como geriu o caso da professora Kathleen Stock.

Com a entrada em vigor da nova Lei da Liberdade de Expressão no Ensino Superior, prevista para agosto, o papel da OfS será ainda mais reforçado, assumindo um papel central na avaliação de disputas relacionadas com discursos controversos, presença de oradores externos e limites à contestação estudantil.

A atuação deste regulador tem gerado debate, especialmente sobre onde traçar a linha entre a proteção da liberdade de expressão e a prevenção de discursos que possam intimidar ou excluir membros da comunidade académica