
Apesar da entrada em vigor da “via verde” para a imigração em abril — um protocolo criado pelo Governo para facilitar a contratação de trabalhadores estrangeiros — as empresas portuguesas continuam a enfrentar sérias dificuldades em recrutar mão de obra, especialmente no setor da restauração. No entanto, um mês após o início do programa, ainda não tinha sido apresentado qualquer pedido, segundo o Notícias ao Minuto.
O grupo Blue Target, que gere 12 espaços de restauração sobretudo na região do Grande Porto e também em Lisboa, confirma o cenário de escassez: “Temos tido enormes dificuldades em recrutar e, em alguns casos, fomos forçados a encerrar temporariamente espaços para reforçar equipas noutras localizações”, refere a gerência.
Segundo o grupo, a falta de profissionais não se deve tanto à falta de formação, mas sim à pouca atratividade do setor: “É um trabalho exigente, com horários difíceis e carga fiscal pesada, tanto para as empresas como para os trabalhadores. Isto afasta muitos jovens, mesmo os que têm formação na área”.
Apesar disso, Carlos Santos, CEO do grupo, diz, em entrevista ao 24notícias, ainda não ter sentido necessidade de recorrer ao Protocolo de Cooperação para a Migração Laboral Regulada, também conhecido como via verde para a imigração.
A iniciativa do Governo procurou responder às recentes dificuldades em emitir vistos para os imigrantes à procura de trabalho que chegam a território nacional, e, assim, aumentar a oferta. A via verde é uma nova forma de acelerar a emissão de vistos e facilitar o processo de contratação de trabalhadores estrangeiros, principalmente para grandes empresas, colmatando o problema apontado pela gerência do grupo de restauração Blue Target.
Na verdade, mais de 70% das equipas desta empresa já são constituídas por trabalhadores estrangeiros, o que, para o empresário, torna o protocolo de migração laboral uma potencial solução, mas não agora. “É uma boa iniciativa, mas ainda não sentimos o impacto. Pode vir a ajudar, sim, e todos os imigrantes que vêm com boas intenções e trabalhar são importantes e bem recebidos”, defende o responsável.
A via verde exige que as empresas garantam contrato, formação, alojamento e aulas de português aos imigrantes, comprometendo-se com um recrutamento ético. Se cumpridos os requisitos, o visto deve ser aprovado em 20 dias, um mecanismo pensado para responder à lentidão e à rigidez dos processos anteriores.
No entanto, para já, o programa não está a dar resposta à urgência de um setor que, como lembra Carlos Santos, “tem uma função social que ficou clara durante a pandemia” e “precisa de políticas públicas que valorizem as carreiras e ajudem a atrair bons profissionais”.
Empresas pedem melhores condições e atenção para o setor
Segundo a gerência do grupo, a escassez de recursos humanos qualificados é um desafio estrutural que ameaça a capacidade de crescimento do setor e trava investimentos que poderiam ter um impacto relevante na economia local.
“Mesmo praticando salários acima da média do setor e evitando horários repartidos, temos enfrentado enormes dificuldades em encontrar colaboradores disponíveis”, afirma Carlos Santos. “A situação agrava-se nos períodos de maior afluência turística, quando as equipas ficam sob uma pressão acrescida. Esta escassez de mão de obra está a limitar o nosso crescimento e a capacidade de concretizar novos projetos.”
A empresa prevê abrir dois novos espaços no Porto até ao final do ano, o que exige a contratação de pelo menos 30 novos profissionais. No entanto, atingir essa meta tem-se revelado cada vez mais complexo. "Já tive de fechar negócios para substituir as equipas", confessa o CEO.
Além do reforço da presença nas grandes cidades, o grupo quer apostar no interior do país, onde identifica “um enorme potencial turístico e gastronómico”. No entanto, alerta: “Se já é difícil recrutar em Lisboa ou no Porto, nas regiões mais afastadas o desafio será ainda maior.”
O empresário defende uma resposta articulada entre o setor privado e o Estado, com políticas públicas focadas na valorização das carreiras na restauração, na criação de incentivos à formação e na atração de talento — nacional e estrangeiro.
“O turismo é um dos principais motores da economia portuguesa, mas sem profissionais capacitados o setor não consegue crescer, nem acompanhar a procura. Precisamos de medidas concretas que tornem esta carreira mais atrativa e sustentável”, conclui. "Sem essas políticas de valorização e também de alguma aligeirada carga fiscal, é difícil atrair mais pessoas para o setor".
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