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Duas pessoas, na casa dos 30 anos, de origem cabo-verdiana, que caíram de um andaime, outra de 37 anos que também caiu numa obra em Vila Real e uma outra de 58 anos, que viu uma placa de cimento cair-lhe em cima, morreram no passado mês de outubro, e estes acidentes trouxeram novamente para a ordem do dia o debate sobre as condições de segurança no trabalho em Portugal. Os números recentemente divulgados pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) revelam que a situação é preocupante.

Entre 2019 e 2024, morreram pelo menos 695 trabalhadores em acidentes de trabalho em Portugal, ao passo que nos últimos cinco anos anteriores, entre 2014 e 2019, já tinham morrido 646. Ou seja, apesar das campanhas, das normas e dos planos, o país registou um agravamento da mortalidade laboral.

O ano de 2024, com 114 mortes, teve ainda assim o número mais baixo dos últimos cinco anos, sendo que em 2023, morreram 156 pessoas enquanto trabalhavam. Os acidentes graves também diminuíram, tendo passado dos 727 em 2022 e 695 em 2023 para 417 em 2024.

Refira-se, contudo, que estes números poderão ser ainda maiores, dado que a ACT apenas contabiliza acidentes em que abre inquérito. Por exemplo, em 2023, a ACT contabilizou 156 mortes, ao passo que as companhias de seguros reportaram ao Ministério Público 448 vítimas mortais relacionadas com acidentes de trabalho.

Construção continua a ser o setor mais letal

A construção civil, onde ocorreu o acidente do último mês, representa o maior número de mortes. Só nos últimos cinco anos, e tendo em conta apenas os dados da ACT, morreram 228 trabalhadores.

Para Albano Ribeiro, dirigente do Sindicato da Construção de Portugal, a situação é “insustentável” e resulta de “anos de falta de investimento em fiscalização e de tolerância perante infratores grosseiros”.

“Há casos em que são os trabalhadores que têm de comprar os seus próprios meios de proteção”, diz o sindicalista, sem esconder a indignação. “Os patrões não garantem condições de higiene e segurança, e com o volume de obras que existem no país, a ACT não tem meios humanos nem materiais para estar em todo o lado.”

Ribeiro acrescenta que, nos últimos anos, o sindicato contactou milhares de trabalhadores em ações de sensibilização sobre equipamentos de proteção individual e coletiva. Mas admite que a formação continua a ser insuficiente, sobretudo entre trabalhadores estrangeiros, que representam uma parte crescente da mão de obra na construção e que muitas vezes desconhecem direitos, regras e procedimentos de segurança.

Os sindicatos e vários especialistas concordam num ponto: a ACT não tem meios suficientes para o país que precisa de fiscalizar. O número de inspetores, que já foi considerado baixo há uma década, continua aquém do recomendado pela Organização Internacional do Trabalho.

“Com o boom da construção e a multiplicação de grandes obras, é impossível chegar a tudo”, afirma Albano Ribeiro.

Assim, a sucessão de acidentes, e a persistência de números tão elevados, mostram que Portugal continua longe de uma cultura de prevenção eficaz, sendo que o Sindicato considera que "a formação é insuficiente, a fiscalização é escassa, os mecanismos de punição são lentos e as empresas nem sempre cumprem a lei".

O governo promete, há anos, reforçar a ACT e lançar programas de formação massiva para trabalhadores estrangeiros, mas os resultados ainda não se fizeram sentir de forma clara.

CGTP pede mais ao Governo

Quem todos os anos exige mais ao Governo na prevenção dos acidentes de trabalho é a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP), que salienta que "a prevenção dos riscos profissionais e a promoção de ambientes laborais seguros continuam a ser pilares essenciais para garantir a saúde, a dignidade e a qualidade de vida dos trabalhadores".

A CGTP diz ainda que "a desregulação dos horários e a intensificação dos ritmos de trabalho, a necessidade de reforçar políticas sólidas de Segurança e Saúde no Trabalho (SST) torna-se ainda mais premente".

"A realidade laboral enfrenta hoje desafios acrescidos: a digitalização, as transformações tecnológicas e o impacto das alterações climáticas colocam novos riscos que exigem respostas rápidas, sustentadas e eficazes. Para a CGTP-IN, é fundamental que o país não desvie o olhar da proteção da vida e da saúde física e mental de quem trabalha", referem, salientando depois que "o Governo deve assumir responsabilidades claras: fortalecer o sistema nacional de SST, desenvolver políticas credíveis, promover estudos sobre os novos riscos profissionais, legislar para proteger os trabalhadores e reforçar a Inspeção do Trabalho com meios adequados".

Entre as exigências da CGTP-IN destaca-se ainda a valorização do papel dos sindicatos na denúncia de práticas laborais abusivas, o reforço da participação dos trabalhadores através do representante para a SST, uma maior articulação entre a ACT e o Ministério Público e a afirmação da contratação colectiva como instrumento essencial para a defesa da segurança e saúde no trabalho.

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